As origens do pensamento sistêmico: das partes para o todo

Por: Lauren Beltrão Gomes

RESUMO O Pensamento Sistêmico foi reformulado ao longo dos anos, tendo sua base epistemológica modificada. O presente artigo objetiva apresentar os aspectos históricos e epistemológicos que constituem o Pensamento Sistêmico, entendendo-se que esta compreensão teórica é fundamental para a prática dos terapeutas sistêmicos nos mais diversos contextos. Reforçam-se as ideias de que pensar sistemicamente implica reconhecer o sujeito em seu contexto, de que os fatos não são previsíveis e de que o terapeuta/pesquisador faz parte do sistema no qual intervém/estuda. Assim, ao fazer uso do Pensamento Sistêmico, o profissional amplia seu olhar sobre a situação, questiona a problemática apresentada, e trabalha com as pessoas envolvidas alternativas de modos mais funcionais de relacionamento. Palavras-chave: Pensamento sistêmico, Teoria sistêmica, Epistemologia. ABSTRACT The Systemic Thinking has been reformulated over the years and its epistemological basis has been modified. This theoretical paper aims to present the historical and epistemological aspects of the Systems Thinking, as well as this theoretical understanding is important for the practice of systemic therapists in various contexts. The paper reinforces the idea that thinking systemically involves recognizing the person in a context, that the facts are not predictable and that the therapist/researcher is part of the system in which he/she intervenes or studies. Thus, to make use of systems thinking, the professional expands the vision of the situation, questions the problematic presented, and works more functional modes of relationship with other people involved. Keywords: Systems thinking, Systems theory, Epistemology. Introdução O Pensamento Sistêmico, hoje disseminado nas diversas áreas do conhecimento, ganhou um arcabouço teórico e reconhecimento na primeira metade do século XX. Embora suas bases tenham sido formuladas entre as décadas de 30 e 40, o processo de mudança do paradigma mecanicista para o ecológico tem ocorrido de forma não linear há muitos séculos, com retrocessos e avanços nos vários campos da ciência. Quando se fala em Teoria ou Pensamento Sistêmico, geralmente se conhece apenas seus principais conceitos e aplicabilidades, de forma que seus fundamentos históricos e epistemológicos dificilmente são aprofundados nos artigos científicos. Há quem não compreenda como as contribuições da Teoria da Comunicação Humana ou da Cibernética estão relacionadas com a Teoria Sistêmica. Sendo assim, este artigo objetiva apresentar os aspectos históricos e epistemológicos do Pensamento Sistêmico, a fim ofertar subsídios que auxiliem a compreensão daqueles que têm interesse por estudar essa perspectiva, bem como revisar os aspectos teóricos de quem trabalha com tal Teoria. Para tanto será realizada, inicialmente, uma retomada histórica de acontecimentos que serviram como embriões para o desenvolvimento do Pensamento Sistêmico. Nesse sentido, a Teoria Geral dos Sistemas, a Cibernética e a Teoria da Comunicação são apresentadas como limites paradigmáticos para a Teoria Sistêmica. Em seguida, serão apresentados os critérios fundamentais do Pensamento Sistêmico e, por fim, será evidenciada sua aplicabilidade na área da Psicologia. Para essa retomada histórica e epistemológica, serão utilizadas algumas das obras clássicas da área que descrevem as origens do pensamento sistêmico, costumeiramente estudadas em cursos de formação de terapeutas sistêmicos, quais sejam, as publicações de Capra (2006) e Vasconcellos (2010). Precursores históricos do Pensamento Sistêmico A fim de tratar dos antecessores históricos da Teoria Sistêmica5, a presente sessão estará baseada na obra de Capra (2006), a qual remonta os momentos, ao longo da história, que influenciaram a formulação de movimentos que serviram como pilares de sustentação para o desenvolvimento do Pensamento Sistêmico. O autor inicia sua jornada na Idade Antiga resgatando as ideias do filósofo grego Aristóteles, o qual acreditava que a matéria continha a natureza essencial de todas as coisas, de forma que a essência somente poderia se tornar real através da forma. A visão de mundo como espiritual, orgânico, característica da filosofia aristotélica, dominou o pensamento ocidental durante toda a Idade Média. Foi apenas nos séculos XVI e XVII, devido à revolução científica proporcionada pelas descobertas da Física, Astronomia e Matemática, que a visão medieval cedeu lugar ao entendimento de que o mundo seria como uma máquina, regido por leis matemáticas exatas. Este momento, chamado de Mecanicismo Cartesiano, teve como seus representantes mais notáveis Galileu Galilei, Copérnico, René Descartes, Francis Bacon e Isaac Newton. O método analítico, um dos símbolos dessa revolução, foi criado por Descartes e consistia no pressuposto de que, quebrando os fenômenos complexos em partes, se poderia compreender o comportamento do todo a partir das propriedades das partes. O Modelo Mecanicista teve sucesso em alguns experimentos, tais como o de William Harvey, por meio do qual foi possível explicar o fenômeno da circulação sanguínea. Outros fisiologistas buscaram, sem sucesso, aplicar o mesmo modelo para compreender funções somáticas como a digestão e o metabolismo, pois tais fenômenos envolviam processos químicos desconhecidos na época. Somente no século XVIII, Antoine Lavoisier, precursor da Química Moderna, confirma a importância dos processos químicos para o funcionamento dos organismos vivos por meio da descoberta de que a respiração é uma forma especial de oxidação. A partir de então, modelos mecanicistas simplistas foram sendo abandonados, embora a essência da ideia cartesiana perdurasse. Opondo-se ao mecanicismo cartesiano surge o Movimento Romântico, que se estende desde o final do século XVIII até o término do XIX. O retorno às ideais aristotélicas ocorreu em função das produções de poetas e filósofos românticos alemães como Immanuel Kant, que voltaram a se concentrar na natureza da forma orgânica. A figura central desse movimento foi Johann Wolfgang Von Goethe, um dos primeiros a usar o termo morfologia para explicar o estudo da forma biológica a partir de um ponto de vista dinâmico. A natureza teria uma forma móvel e seguiria um padrão de relações dentro de um grande todo organizado e harmonioso. A preocupação básica dos biólogos tornou-se o problema da forma biológica, de modo que as questões referentes às composições materiais tornaram-se secundárias. Na segunda metade do século XIX, o aperfeiçoamento do microscópio possibilita importantes avanços na Biologia resgatando o Pensamento Mecanicista. Com a Teoria das Células, o foco dos biólogos foi deslocado do organismo em direção às células. Neste contexto, Louis Pasteur lança sua Teoria Microbiana de acordo com a qual as bactérias seriam a única causa das doenças. Embora a biologia celular tivesse avançado muito na compreensão das estruturas e das funções de muitas das subunidades, ainda não era possível explicar as atividades coordenadoras que integram essas operações no funcionamento da célula como um todo. Tal compreensão se tornou possível apenas no século XX, no qual surge a Biologia Organísmica ou Organicismo como um movimento de oposição ao Mecanicismo e que se delineia como forte influência na construção do Pensamento Sistêmico. As ideias de Aristóteles, Goethe, Kant e Cuvier são aprimoradas e causam grande impacto negando pensamentos estruturais do Mecanicismo Cartesiano, tais como o método analítico. Segundo a concepção Organísmica, as propriedades essenciais de um organismo pertencem ao todo, de maneira que nenhuma das partes as possuem, pois tais propriedades surgem justamente das interações entre as partes. Portanto, as propriedades das partes podem ser entendidas apenas a partir da organização do todo. O Organicismo coloca o foco no entendimento das relações organizadoras sendo que a concepção de organização foi aperfeiçoada posteriormente com o conceito de auto-organização. A Ecologia, uma das vertentes do Pensamento Sistêmico, emerge da Escola Organísmica da Biologia quando biólogos começaram a estudar comunidades de organismos. O foco estava colocado no estudo das relações que interligam os organismos. A concepção de ecossistema moldou todo o pensamento ecológico a partir de então e promoveu uma abordagem sistêmica da ecologia. A compreensão dos sistemas vivos como redes oferece uma nova perspectiva acerca das chamadas hierarquias da natureza. Neste sentido, de acordo com Capra (2006), não existe hierarquia na natureza e sim, redes que se formam dentro de outras redes. Paralelamente ao nascimento da Ecologia, surge a Física Quântica, formulada Werner Heisenberg na década de 1920, que contraria o pensamento newtoniano predominante até então, segundo o qual todos os fenômenos físicos poderiam ser reduzidos às propriedades de partículas materiais rígidas e sólidas. Tal teoria demonstra que os objetos materiais sólidos da física clássica se dissolvem, no nível subatômico, em padrões de probabilidades semelhantes a ondas. Tais padrões não representam probabilidade de coisas e sim, probabilidades de interconexões. As partículas subatômicas não são coisas, são interconexões entre coisas que, por sua vez, são interconexões entre outras coisas. Portanto, não se pode decompor o mundo em unidades elementares que existem de forma independente: estas só podem ser entendidas nas interrelações. Sendo assim, é o todo que determina o comportamento das partes. Ainda na década de 1920, durante a República de Weimar na Alemanha, quando a tendência intelectual era negar a fragmentação e o mecanicismo, buscando a totalidade, surge a Psicologia da Gestalt. Psicólogos liderados por Max Wertheimer e Wolfgang Köhler reconhecem a existência de totalidades irredutíveis como aspecto chave da percepção afirmando que totalidades exibem qualidades que estão ausentes em suas partes. O filósofo Christian Von Ehrenfels afirma que o todo é maior do que a soma das partes, princípio este que se tornou central na Teoria Sistêmica. Uma década mais tarde, o biólogo austríaco Ludwig Von Bertalanffy apresenta a Teoria Geral dos Sistemas e, em 1940, e o matemático norte-americano Norbert Wiener inicia a elaboração da Cibernética. Ambas as teorias tiveram desenvolvimento paralelo no século XX e configuram os limites paradigmáticos para a Teoria Sistêmica, em conjunto com a influência da Teoria da Comunicação Humana, criada por Gregory Bateson e Paul Watzlawick. A seguir, tratar-se-á de cada uma das teorias supracitadas. A Teoria Geral dos Sistemas: considerações históricas e conceituais Desde a década de 1920, quando inicia sua carreira como biólogo em Viena, Ludwig Von Bertalanffy critica a predominância do enfoque mecanicista tanto na teoria quanto na pesquisa científica. Em 1925, ele publica suas ideias em alemão e, em 1930, lança alguns artigos na Inglaterra. Na década seguinte, o autor apresenta sua teoria do organismo considerado como sistema aberto. Em meio ao contexto da Segunda Guerra Mundial, as ideias de Bertalanffy não foram bem aceitas em um primeiro momento. O biólogo conhece então, a Teoria da Cibernética que florescia nos Estados Unidos e passa a ser influenciado por ela. Em 1960, Bertalanffy começa a ministrar conferências nos Estados Unidos e em 1967 e 1968 publica a Teoria Geral dos Sistemas por meio de uma editora canadense e, em função da maior propagação de suas ideias, que passam a estar disponíveis em língua inglesa, a Teoria ganha visibilidade (Vasconcellos, 2010). A Teoria Geral dos Sistemas também é conhecida por Teoria Sistêmica. Contudo, elas são diferentes, visto que a Teoria Geral dos Sistemas é mais ampla e abarca todas as áreas do conhecimento (Física, Química, entre outras). Já a Teoria Sistêmica está mais voltada para a área da Psicologia. Para fins práticos, elas serão utilizadas como sinônimos, o que não se mostra errôneo, mas faz-se essa ressalva para fins didáticos e de esclarecimento (Costa, 2010). Assinala-se que, em 1912, o pesquisador, médico, filósofo e economista russo Alexander Bogdanov, também desenvolveu uma teoria, que se assemelha à Teoria Geral dos Sistemas, a qual deu o nome de Tectologia. O principal objetivo era esclarecer e generalizar os princípios de organização de todas as estruturas vivas e não vivas e formular uma ciência universal da organização. Mesmo que tal teoria seja anterior a Teoria Geral dos Sistemas e que, em 1928, tenha sido publicada uma segunda edição elaborada em alemão, Bertalanffy não faz referências a Bogdanov em seus livros (Capra, 2006). Bertalanffy confere importância ao Pensamento Sistêmico como um movimento científico por meio de suas concepções de sistema aberto e de sua Teoria Geral dos Sistemas. De acordo com o autor, organismos vivos são sistemas abertos que não podem ser descritos pela termodinâmica clássica, que trata de sistemas fechados em estado de equilíbrio térmico ou próximo dele. Os sistemas abertos podem se alimentar de um contínuo fluxo de matéria e de energia extraídas e devolvidas ao meio ambiente. Mantêm-se, portanto, afastados do equilíbrio em um estado quase estacionário ou em equilíbrio dinâmico (Capra, 2006). O objetivo da Teoria Geral dos Sistemas se constituía em estudar os princípios universais aplicáveis aos sistemas em geral, sejam eles de natureza física, biológica ou sociológica. Bertalanffy conceitua sistema como um complexo de elementos em estado de interação. A interação ou a relação entre os componentes torna os elementos mutuamente interdependentes e caracteriza o sistema, diferenciando-o do aglomerado de partes independentes (Vasconcellos, 2010). A Teoria Geral dos Sistemas combina conceitos do Pensamento Sistêmico e da Biologia (Costa, 2010), incidindo na generalização do Modelo Organicista, ou seja, na noção de que o universo pode ser pensado como um grande organismo vivo (Pinheiro, Crepaldi, & Cruz, 2012). Assim, pressupõem-se que os fenômenos não podem ser considerados isoladamente, e sim, como parte de um todo. Sendo assim, o todo emerge além da existência das partes e "as relações são o que dá coesão ao sistema todo, conferindo-lhe um caráter de totalidade ou globalidade, uma das características definidoras do sistema" (Vasconcellos, 2008, p.199). Os conceitos básicos de sua teoria são: globalidade, não-somatividade, homeostase, morfogênese, circularidade e equifinalidade (Vasconcellos, 2010). Segue abaixo uma breve descrição de cada um desses conceitos. De acordo com a globalidade, todos os sistemas funcionam como um todo coeso e mudanças em uma das partes provocam mudanças no todo. O conceito de não-somatividade afirma que o sistema não é a soma das partes, devendo-se considerar o todo em sua complexidade e organização; assim, embora o indivíduo faça parte da família, ele mantém sua individualidade. A homeostase é o processo de autorregulação que mantém a estabilidade do sistema preservando seu funcionamento. A morfogênese é o processo oposto a homeostase, ou seja, é a característica dos sistemas abertos de absorver os aspectos externos do meio e mudar sua organização. A circularidade, também chamada de causalidade circular, bilateralidade ou não-unilateralidade, diz respeito à relação bilateral entre elementos, sendo que esta relação é não linear e obedece a uma sequência circular. O último conceito, equifinalidade, refere que em um sistema aberto, o resultado de seu funcionamento independe do ponto de partida, ou seja, o equilíbrio é determinado pelos parâmetros do sistema; diferentes condições iniciais geram igualdade de resultados e diferentes resultados podem ser gerados por diferentes condições iniciais. Desta forma, nos sistemas fechados o estado de equilíbrio é dado pelas condições iniciais (Barcellos & Moré, 2007; Osorio, 2002; Vasconcellos, 2010). A Teoria Geral dos Sistemas também fez uso do conceito de retroalimentação ou feedback que emergiu na cibernética (como será ressaltado adiante), o qual garante a circulação de informações entre elementos do sistema. A retroalimentação pode ser negativa, o que acontece quando esse mantém a homeostase, ou positiva, ocorre quando o sistema responde pela mudança sistêmica (morfogênese) (Vasconcellos, 2010). Além desses conceitos, Bertalanffy dedicou-se a investigar os princípios básicos interdisciplinares que pudessem constituir uma teoria interdisciplinar. Apontou para a necessidade de categorias mais amplas de pensamento científico, de forma que a Sociologia e a Biologia também pudessem ser abarcadas por uma ciência mais rigorosa, além da Física e da Química. O autor não queria se afastar do referencial da ciência tradicional e por isso manteve-se preso ao pressuposto de objetividade. Ele acreditava em um mundo hierarquicamente organizado, em uma realidade independente do observador (Capra, 2006). De acordo com Bertalanffy, uma Teoria Geral dos Sistemas ofereceria um arcabouço conceitual abrangente capaz de unificar várias disciplinas científicas que, naquele momento, estavam isoladas e fragmentadas. Propõe, portanto, uma ciência da totalidade, da integridade ou de entidades totalitárias. O autor busca uma síntese do conhecimento sem eliminar as diferenças por meio de um esquema claro e consistente de conceitos, uma teoria unitária em torno de conceitos de sistema e organização. O foco é deslocado da constituição das entidades para a organização dos sistemas e para o conceito de interação (Grandesso, 2000). A interação gera realimentações (feedbacks) que podem ser positivas ou negativas, criando assim uma autorregulação regenerativa, que, por sua vez, cria novas propriedades, as quais podem ser benéficas ou maléficas para o todo independente das partes. A interação dos elementos do sistema é chamada de sinergia. Por outro lado, a entropia é a desordem ou ausência de sinergia. Um sistema pára de funcionar adequadamente quando ocorre entropia interna. Os sistemas orgânicos em que as alterações benéficas são absorvidas e aproveitadas sobrevivem, e os sistemas onde as qualidades maléficas ao todo resultam em dificuldade de sobrevivência tendem a desaparecer caso não haja outra alteração de contrabalanço que neutralize aquela primeira mutação. Assim, de acordo com Bertalanffy, a mudança permanece ininterrupta enquanto os sistemas se autorregulam e se retroalimentam (Vasconcellos, 2010). Um sistema realimentado é necessariamente um sistema dinâmico, já que deve haver uma causalidade implícita. Em um ciclo de retroação, uma saída é capaz de alterar a entrada que a gerou, e consequentemente, a si própria. Se o sistema fosse instantâneo, essa alteração implicaria uma desigualdade. Portanto, em uma malha de realimentação deve haver certo retardo na resposta dinâmica. Esse retardo ocorre devido a uma tendência do sistema de manter o estado atual mesmo com variações bruscas na entrada, isto é, ele deve possuir uma tendência de resistência a mudanças. Assim, uma organização realimentada e autogerenciada gera um sistema cujo funcionamento é independente da substância concreta dos elementos que a formam. Dessa forma, elementos podem ser substituídos sem dano ao todo, o que caracteriza o processo de autorregulação, no qual o todo assume as tarefas da parte que falhou (Vasconcellos, 2010). Na década de 1940, aportes teóricos se articularam à Teoria Geral dos Sistemas, quais sejam, a Cibernética e a Teoria da Comunicação. Embora Osório (2002) afirme que a Teoria dos Jogos também influenciou a Teoria Geral dos Sistemas, optou-se aqui por tratar exclusivamente da Cibernética e da Teoria da Comunicação, visto apenas estas são referenciadas nas obras como fundantes da Teoria Geral dos Sistemas. A Cibernética A Teoria da Cibernética foi desenvolvida pelo matemático americano, e professor do Massachussets Institute of Technology (MIT), Norbert Wiener (1894-1964). No início da década de 1940, Wiener participava de reuniões vinculadas à escola de Medicina de Harvard nas quais se discutia o método científico. Estas reuniões tinham uma proposta interdisciplinar, pois participavam professores e pesquisadores de diversas áreas que se interessavam pelo tema. Assim, Wiener conheceu Walter Cannon e Arturo Rosenblueth (fisiologistas), com os quais iniciou discussões que deram início ao pensamento que originou a Cibernética (Vasconcellos, 2010). Naquela época, o mundo vivia a Segunda Guerra Mundial e os Estados Unidos começou a financiar pesquisas que pudessem contribuir para a melhoria das máquinas de guerra. Com isso, Wiener, em parceria com Rosenblueth e com o engenheiro eletrônico Julian Bigelow, criou um projeto que aprimorou a artilharia antiaérea. Wierner desenvolveu programas e "máquinas computadoras" que tinham conexão com o sistema nervoso humano. A ideia de Wierner e dos pesquisadores com quem trabalhava era de projetar máquinas que tivessem performance de funções humanas. Nas pesquisas realizadas para a execução do projeto, Wiener e Bigelow criaram o conceito de feedback, também chamado de realimentação ou retroação (como já mencionado anteriormente), o qual foi desenvolvido para explicar de que forma pode-se corrigir desvios a máquinas computadorizadas, os quais eram essenciais para a guerra e se fazia analogia entre o funcionamento do sistema nervoso e o funcionamento das máquinas de computação (Vasconcellos, 2010). Em 1944, houve um encontro em Princenton para discutir "Cibernética", do qual participaram engenheiros, projetistas de máquinas computadorizadas, fisiologistas, neurocientistas e matemáticos. Em 1946, acontece a 1ª Conferência Macy em Nova Iorque, a qual teve como tema "Feedback" e que contou com a presença dos pesquisadores acima citados e de psicólogos, antropólogos, economistas e especialistas na Teoria dos Jogos. O encontro pretendia reunir cientistas que pudessem ajudar na compreensão do sistema nervoso, comunidades sociais e meios de comunicação. Nos anos subsequentes, houve várias conferências Macy e pode-se afirmar que o arcabouço teórico da Cibernética foi construído nestes encontros. A partir dessas reuniões, a área foi reconhecida por inúmeras realizações tecnológicas, tais como: aparelho que permite aos cegos a leitura auditiva de um texto impresso, computadores ultrarrápidos, próteses para membros perdidos, máquinas artificiais com performances altamente elaboradas, pulmão artificial, máquina de jogar xadrez, aparelho auditivo para deficientes auditivos, máquinas para atuarem em situações em que o trabalho implica risco para o homem, dentre outras invenções (Vasconcellos, 2010). Desta forma, no final de década de 1940, Wierner escreveu sobre a Teoria da Cibernética, também chamada de "Ciência da Correção". O termo Cibernética origina-se da palavra grega kybernetes que significa piloto, condutor. Desta forma, tal teoria apresenta uma tendência mecanicista por sua associação com máquinas ou sistemas artificiais. A preocupação do autor era com a construção de sistemas que reproduzissem os mecanismos de funcionamento de sistemas vivos, isto é, ele propôs a construção dos chamados autômatos simuladores de vida ou máquinas Cibernéticas (Vasconcellos, 2010). Para Wiener, o propósito da Cibernética era o de desenvolver uma linguagem e técnicas que permitissem abordar o problema da comunicação e do controle em geral. Portanto, considerava que a mensagem era o elemento central, tanto na comunicação quanto no controle, ou seja, quando nos comunicamos enviamos uma mensagem e, da mesma forma, quando comandamos. A mensagem pode ser transmitida por meios elétricos, mecânicos ou nervosos e é considerada uma sequência de eventos mensuráveis, distribuídos no tempo (Vasconcellos, 2010). Por esta razão, o antropólogo Gregory Bateson, que também participava das conferências Macy, desenvolve a Teoria da Comunicação que contribui de forma significativa para a melhoria das máquinas Cibernéticas. A Teoria da Cibernética divide-se em Cibernética de 1ª ordem e de 2ª ordem. A Cibernética de 1ª ordem se subdivide em 1ª e 2ª Cibernética. A 1ª Cibernética trata dos processos morfoestáticos (manutenção da mesma forma), resultantes da retroalimentação negativa ou retroação autorreguladora, a qual conduz o sistema de volta a seu estado de equilíbrio homeostático, otimizando a obtenção da meta. Assim, trata da capacidade de auto-estabilização ou de automanutenção do sistema (Vasconcellos, 2010). Apresenta conceitos de input e output, enfatiza a presença do observador fora do sistema e como expert (objetividade), e a compreensão dos fenômenos ainda está arraigada à causalidade linear (estabilidade). Assim, nesta 1ª Cibernética emerge o pressuposto da complexidade, que reconhece que a simplificação obscurece as inter-relações e, portanto, busca-se contextualizar os fenômenos e explorar os sistemas dos sistemas, entendendo que não há uma causalidade linear e sim, circular (Vasconcellos, 2010). Já a 2ª Cibernética trata dos processos morfogenéticos (gênese de novas formas), resultantes de retroalimentação positiva ou retroação amplificadora de desvios, amplificação que pode - caso não produza a destruição do sistema e se a estrutura do mesmo permitir - promover sua transformação, levando-o a um novo regime de funcionamento. Trata da capacidade de auto-mudança do sistema (Vasconcellos, 2010). Os conceitos de input e output persistem, mas aparece o conceito de feedback (criado por Wiener e Bigelow, como já mencionado anteriormente) e de causalidade circular retroativa e recursiva. Assim, aqui tem origem o pressuposto da instabilidade, o qual baseia-se na noção do mundo como em um processo de constante transformação, no qual há a indeterminação e, por isso, alguns fenômenos são imprevisíveis e irreversíveis, e, portanto, incontroláveis (Vasconcellos, 2010). A Cibernética de 2ª ordem também é chamada de Si-Cibernética porque Edgar Morin propôs um movimento que ultrapassasse a Cibernética: a Si-Cibernética. O prefixo si é o elemento da preposição grega sun que significa "estar junto", o que marca a obrigação recíproca entre as partes. O físico Heinz Von Foster é considerado uma figura central para o desenvolvimento da Si-Cibernética. Ele é responsável pela noção de sistemas observantes, de acordo com o qual o observador, incluindo-se no sistema que observa, se observa observando (Vasconcellos, 2010). A partir da noção de sistemas observantes, a Cibernética tomou a si mesma como objeto de estudo e surgiu, então, a Cibernética de 2ª ordem, também chamada de construtivismo ou visão construtivista, pois pressupõe o observador como parte do sistema observado (Osorio, 2002; Vasconcellos, 2010). Então, a Cibernética de 2ª ordem, também chamada de Cibernética da Cibernética, ou Cibernética novo-paradigmática, apresenta os três pressupostos da ciência novo-paradigmática, quais sejam: complexidade, instabilidade e intersubjetividade. A noção de complexidade está ligada a sistemas, ecossistemas, causalidade circular, recursividade, contradições e pensamento complexo. A ideia de instabilidade está relacionada à desordem, evolução, imprevisibilidade, saltos qualitativos, auto-organização e incontrolabilidade. O pressuposto da intersubjetividade envolve a inclusão do observador, autorreferência, significação da experiência na conversação e coconstrução (Vasconcellos, 2010). A articulação dos desenvolvimentos da Cibernética que fazem emergir a Si-Cibernética mudou os pressupostos epistemológicos da ciência tradicional (simplicidade, instabilidade e objetividade), exigindo uma reorganização dos conceitos anteriormente elaborados (Barcellos & Moré, 2007). Fala-se então em Pensamento Sistêmico, o qual também é chamado de epistemologia sistêmica, de novo paradigma da ciência (ou paradigma da ciência contemporânea), ou ainda, de epistemologia da ciência novo-paradigmática (Vasconcellos, 2010). Todavia, nem tudo o que é sistêmico e nem tudo o que se apresenta como Teoria Sistêmica ou Pensamento Sistêmico, pode ser reconhecido como sendo da epistemologia da ciência novo-paradigmática; para que seja novo-paradigmático, é necessário que tenha os três pressupostos mencionados acima, quais sejam, complexidade, instabilidade e intersubjetividade. A Teoria da Comunicação Gregory Bateson (1904-1980), antropólogo inglês, se utilizou das teorias acima citadas para desenvolver a Teoria da Comunicação. O autor, junto com seus colaboradores de Palo Alto (Califórnia), descreveu a comunicação patogênica na família do esquizofrênico e apresentou a hipótese do duplo vínculo, ou seja, uma forma de comunicação paradoxal que tem profundas implicações nas relações interpessoais. Bateson fazia uso de analogias, metáforas e histórias por acreditar que esses recursos eram um caminho para o estudo das relações (Osório, 2002). O processo de comunicação humana abrange uma complexidade de fatores, tais como conteúdo, forma e linguagem, os quais estão sempre presentes nos processos interrelacionais. A Teoria da Comunicação humana, na sua origem, engloba três dimensões: a sintaxe, a semântica e a pragmática. A sintaxe se refere à transmissão da informação; a semântica está relacionada ao significado dos símbolos; e a pragmática diz respeito aos aspectos comportamentais da comunicação. A teoria também apresenta o conceito da metacomunicação (comunicação sobre a comunicação) e o uso de mensagens congruentes ou incongruentes (Watzlawick, Beavin, & Jackson, 1973). Segundo Watzlawick et al. (1973), invariavelmente as pessoas enviam e recebem uma diversidade de mensagens, sejam elas pelos canais verbais ou não verbais, e as mesmas necessariamente modificam ou afetam umas às outras. Quando duas pessoas interagem constantemente, reforçam e estimulam o que está sendo dito ou feito, de tal forma que o padrão de comunicação entre os participantes de uma interação define o relacionamento entre eles. Percebe-se, assim, que a importância das mensagens não está vinculada somente à questão de comunicar algo, mas também, e especialmente, à influência que ela exerce no comportamento e nas atitudes das pessoas em interação (Nieweglowski & More, 2008). A Teoria da Pragmática da Comunicação Humana afirma que a comunicação afeta o comportamento ocasionando implicações nas relações interpessoais. De acordo com Watzlawick et al. (1973), "atividade ou inatividade, palavras ou silêncio, tudo possui valor de mensagem, influencia os outros, e estes outros que, por sua vez, não podem não responder a essas comunicações, estão, portanto, comunicando também" (p. 45). Além disso, Bateson e Watzlawick preconizaram que a teoria também abarca os cinco axiomas que são: 1) É impossível não comunicar; 2) Toda comunicação tem aspecto de relato (conteúdo) e de ordem (relação); 3) A natureza de uma relação está na contingência da pontuação das sequências comunicacionais entre os comunicantes (cada comportamento é causa e efeito do outro); 4) Os seres humanos se comunicam de maneira digital (comunicação verbal) e analógica (comunicação não-verbal); e 5) Todas as permutas comunicacionais ou são simétricas ou complementares, e estão baseadas na igualdade ou na diferença (Watzlawick et al. 1973). Bateson concebeu um conceito novo e radical de mente, capaz de superar a visão cartesiana. Mente é um fenômeno sistêmico característico dos seres vivos, uma característica relacional. A mente não está no cérebro e sim nas relações. Também nega a objetividade da realidade quando afirma que o observador traz a marca de quem observa. Não existe, portanto, uma realidade objetiva, independente do observador (Vasconcellos, 2010), conforme já explicitado no pressuposto da intersubjetividade. A compreensão dos padrões comunicacionais que possibilitam ou dificultam as relações são de suma importância para aqueles que trabalham dentro do paradigma sistêmico. A seguir, serão destacados os principais requisitos para a formulação do Pensamento Sistêmico. Critérios fundamentais do Pensamento Sistêmico A palavra "sistema" deriva do grego synhistanai que significa colocar junto. O entendimento sistêmico requer uma compreensão dentro de um contexto, de forma a estabelecer a natureza das relações. A principal característica da organização dos organismos vivos é a natureza hierárquica, ou seja, a tendência para formar estruturas multiniveladas de sistemas dentro de sistemas. Cada um dos sistemas forma um todo com relação as suas partes e também é parte de um todo. A existência de diferentes níveis de complexidade com diferentes tipos de leis operando em cada nível forma a concepção de "complexidade organizada" (Vasconcellos, 2010). O primeiro dos critérios fundamentais do Pensamento Sistêmico se refere à mudança das partes para o todo, a partir do entendimento de que as propriedades essenciais são do todo de forma que nenhuma das partes as possui, pois estas surgem justamente das relações de organização entre as partes para formar o todo. Outro critério diz respeito à capacidade de deslocar a atenção de um lado para o outro entre níveis sistêmicos (Vasconcellos, 2010). O pensamento é contextual, pois a análise das propriedades das partes não explica o todo. É ambientalista porque considera o contexto. A ênfase está nas relações e não nos objetos, ou seja, os próprios objetos são redes de relações, embutidas em redes maiores. O mundo vivo é entendido como uma rede de relações. O conhecimento científico é tido como uma rede de concepções e de modelos sem fundamentos firmes e sem que um deles seja mais importante do que outros. O mundo material é visto como uma teia dinâmica de eventos interrelacionados (Vasconcellos, 2010). Por fim, o último critério se refere à mudança da ciência objetiva para a epistêmica; o método de questionamento torna-se parte integral das teorias científicas. A compreensão do processo de conhecimento precisa ser explicitamente incluída na descrição dos fenômenos naturais, de forma que tais descrições não são objetivas (Capra, 2006; Grandesso, 2000; Vasconcellos, 2010). A prática sistêmica no campo da Psicologia Fundamentada na Teoria Geral dos Sistemas proposta por Bertalanffy, na Cibernética de Wiener e na Teoria da Comunicação, formulada por Bateson e Watzlawick, surge a prática sistêmica. Capra destaca que "com o forte apoio subsequente vindo da Cibernética, as concepções de Pensamento Sistêmico e de Teoria Sistêmica tornaram-se partes integrais da linguagem científica estabelecida, e levaram a numerosas metodologias e aplicações novas" (1996, p. 53). Atualmente, as áreas de aplicação do Pensamento Sistêmico são planejamento e avaliação, educação, negócios e administração, saúde pública, sociologia, ciências da terra, desenvolvimento humano, ciências cognitivas, dentre outras (Cabrera, Colosi & Lobdell, 2008). No campo da Psicologia Clínica, até a década de 1940, a prática terapêutica era orientada pela Psicanálise e a ideia hegemônica era a de que o comportamento humano era regido por forças intrapsíquicas. Como consequência da Segunda Guerra Mundial, houve um movimento de união das famílias e tornaram-se mais fortes as críticas à Psicanálise por não dar a ênfase necessária aos contextos ambientais. A Teoria Sistêmica passa a ganhar força trazendo a proposta de mudança no foco das teorias clínicas do indivíduo para os sistemas humanos, ou seja, do intrapsíquico para o interrelacional. Dessa forma, nas décadas de 50 e 60, ocorre um movimento de combinação entre abordagens já consolidadas, tais como a psicanalítica, e novos conceitos baseados na Teoria dos Sistemas, na Cibernética e na Teoria da Comunicação. Desta combinação nasce uma "nova perspectiva sobre a complexidade e reciprocidade do comportamento humano e seu desenvolvimento dentro da rede de relações e da cultura da comunicação dentro da família" (Kreppner, 2003, p. 202). De acordo com a Perspectiva Sistêmica, os sistemas devem ser vistos como estruturas organizadas hierarquicamente que precisam ser analisadas em sua totalidade: desde os aspectos macro, como a ordem social, passando por níveis intermediários, como as culturas das comunidades locais, até atingir um nível mais proximal (ou de microanálise), como as escolas e a família (Sifuentes, Dessen & Oliveira, 2007). Conforme Grandesso (2000), a mudança de foco do intrapsíquico para o interrelacional representou uma transformação paradigmática à medida que passou a configurar outro sistema de pressupostos para informar a concepção dos problemas humanos e das práticas da Psicologia. A ênfase passa a ser dada aos contextos e formula-se a postulação de uma causalidade circular retroativa e recursiva para os fenômenos, o que favoreceu a abertura do campo da psicoterapia para a interdisciplinaridade e ampliou as fronteiras para a compreensão da pessoa humana para além do psicológico. O Pensamento Sistêmico passa a ser o substrato de propostas de intervenção para a clínica de família. Dessen (2010) ressalta a relevante contribuição da Teoria Sistêmica da família, a partir da segunda metade do século XX, visto que trouxe um novo olhar para o contexto familiar. A adoção da Perspectiva Sistêmica implica em entender a família como um sistema complexo, composto por vários subsistemas que se influenciam mutuamente, tais como o conjugal e o parental (Kreppner, 2000). O estudo de Costa (2010) destaca brevemente os momentos cruciais da construção teórico-metodológica que caracterizaram o início da Terapia de Família e marcaram seu desenvolvimento. A autora também apresenta as diferentes Escolas de Terapia Familiar, desde aquelas fortemente influenciadas pela Cibernética até aquelas que assimilaram as contribuições do Construtivismo e do Construcionismo Social. Böing, Crepaldi e Moré (2009) abordam os benefícios da adoção da epistemologia sistêmica pelos profissionais de saúde, pois a compreensão da complexidade do processo saúde-doença leva-os a reconhecer a necessidade da atuação interdisciplinar para a construção efetiva de atenção integral à saúde, em conformidade com os princípios fundamentais do Sistema Único de Saúde. De acordo com as autoras, o Pensamento Sistêmico pode funcionar como uma base para o profissional refletir, flexibilizar e contextualizar suas práticas, possibilitando que as mesmas respondam de forma eficiente às demandas da atenção básica. Nesse sentido, pensar sistemicamente transcende a atuação profissional, enriquece e amplia a visão e a atuação como cidadãos, o que possibilita a reflexão e o diálogo em torno dos problemas sociais e comunitários de modo mais abrangente e contextualizado (Moré & Macedo, 2006). Böing et al. (2009) ressaltam que, na área da saúde, a escuta psicológica, de acordo com a Perspectiva Sistêmica, é considerada uma estratégia para considerar seres humanos em contextos de forma que as ações sempre partam do contexto e sejam dirigidas para o contexto. O profissional de Psicologia, nesse cenário, desempenha um papel de mediador e catalisador das potencialidades e dos recursos, tanto das pessoas em si como da comunidade, na satisfação das necessidades e na melhora da qualidade de vida. O psicólogo, juntamente aos demais profissionais da equipe de saúde, coordena ações que levem à ampliação da situação apresentada, criem contextos de autonomia e favoreçam a mudança (Moré & Macedo, 2006; Vasconcellos, 2008). O Pensamento Sistêmico pode ser utilizado em qualquer contexto, como em situações de mediação familiar em ambiente jurídico (Bueno, Leal, & Souza, 2012). Nesse contexto, o embasamento sistêmico se mostra útil para pensar as famílias e os casais cujo processo de separação conjugal litigioso foi o motivo do encaminhamento. Ao compreender essas famílias como sistemas, amplia-se o olhar sobre as mesmas, corresponsabiliza-se os membros da família pelo modo de relacionamento estabelecido e questiona-se a problemática apresentada, explorando o que está por trás do conflito. Realizar intervenções de modo a modificar os padrões de interação disfuncionais tem se mostrado benéfico, pois ao desenvolver formas de relacionamento mais funcionais, o sistema se mostra mais saudável. Considerações finais A Teoria Sistêmica recebeu influência da Cibernética e da Teoria da Comunicação Humana; em termos gerais, da primeira tomou os conceitos de feedback, homeostase e causalidade circular (retroativa e recursiva), e da segunda utilizou os axiomas da comunicação. A compreensão histórica e conceitual acerca do processo de construção do Pensamento Sistêmico, bem como de suas bases estruturantes é imprescindível, pois toda prática está ou deveria estar articulada à compreensão teórica do fenômeno de estudo ou intervenção. Desse modo, ao fazer uso do Pensamento Sistêmico, entende-se que a ciência não pode fornecer uma compreensão completa e definitiva, pois sempre se lida com descrições limitadas e aproximadas da realidade. Tal forma de compreender o mundo e as relações pode ser usada em diversos contextos e em várias áreas do saber. Dentro da Psicologia, o Pensamento Sistêmico pode ser utilizado tanto para o embasamento teórico de pesquisas quanto na intervenção clínica com indivíduos, famílias e grupos sociais. Pensar sistemicamente, embasando-se na ciência novo paradigmática, implica reconhecer o sujeito no seu contexto; o terapeuta ou pesquisador se inclui no sistema no qual intervém ou que estuda, entendendo que a realidade não é estática e nem presumível. Assim, pensar sistemicamente não significa negar os fenômenos intrapsíquicos, e sim buscar compreender e trabalhar os fenômenos psíquicos de uma complexa rede de relações interpessoais. Referências Barcellos, W. B. E., & Moré, C. L. O. O. (2007). Profissionais trabalhando com famílias em situação de violência intrafamiliar: Como a abordagem sistêmica pode ajudar? (Resumo expandido). Ciência, Cuidado e Saúde, 6(1). [ Links ] Böing, E., Crepaldi, M. A., & Moré, C. L. O. O. (2009). A epistemologia sistêmica como substrato à atuação do psicólogo na atenção básica. Psicologia: Ciência e Profissão, 29(4), 828-845. [ Links ] Bueno, R. K.; Leal, C. F. R.; Souza, S. A. de. (2012). Mediação na Defensoria Pública: Um relato de experiência. 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Doutoranda em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 3 Psicóloga. Especialista em Terapia Individual, Familiar e de Casal. Mestre em Psicologia. Doutoranda em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 4 Psicóloga. Mestre em Psicologia Clínica. Doutora em Saúde Mental. Docente do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 5 Compreende-se o Pensamento Sistêmico e a Teoria Sistêmica como distintos, conforme será explicitado no decorrer do presente artigo. Contudo, para facilitar a compreensão, a Teoria Sistêmica será considerada como sinônimo de Pensamento Sistêmico, uma vez que foi a partir dela que o mesmo desenvolveu-se.

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